segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Manuel Hermínio Monteiro — 10/09/1952 § 03/06/2001


Há muitos e muitos milhares de anos, a poesia aproximou-se do homem e tão próximos ficaram, que ela se instalou no seu coração. E começaram a ver o mundo conjuntamente estabelecendo uma inseparável relação que perdurará para sempre. Não demorou muito a que a poesia se emancipasse, autonomizando-se. Como uma rosa de cujas pétalas centrípetas emana a beleza e o mais intenso perfume, sem nunca prescindir da defesa vigilante dos seus espinhos, assim cresceu livre a poesia carregada de silencioso mistério e sedução.
Evitou sempre a vaidade. Mas o vento da história, inapercebidamente, por vezes, demorou-se nela libertando o seu perfume, soltando os seus enigmas, fazendo-a avançar com todo o esplendor. E nada existe que a poesia não tenha experimentado, desde o mais recôndito silêncio do deserto, ao fragor das batalhas mais sangrentas. Da mais humilde das intimidades, ao luxo sinuoso do palácio. Com o tempo, e já depois da comunhão primordial, era o homem, por necessidade de uma comunicação maior, que a procurava e lhe abria o coração, até que ela, muito discretamente, voltava a estremecer no seu sangue.
Poesia e homem criaram assim uma cúmplice e indissociável relação por todo o mundo, embora a História pouco se tenha disso apercebido. Hoje sabemos que haverá sempre seres humanos que a reconhecem pela substância do seu silêncio. Pelo tempo e lugar do seu rigor de ave de arribação. Pelo seu fulgor. Pelo seu perfume. Pela riqueza inesperada das suas sugestões. Com um pequeno gesto os poetas soltam o seu pólen que, levado pelas palavras vai eternamente fecundando os arcos da beleza que erguem o universo e o põem em comunicação com Deus.

Manuel Hermínio Monteiro na sua introdução ao livro «Rosa do Mundo — 2001 Poemas para o Futuro». 


1 comentário:

Teresa Poças disse...

"Com um pequeno gesto os poetas soltam o seu pólen que, levado pelas palavras vai eternamente fecundando os arcos da beleza que erguem o universo e o põem em comunicação com Deus."

Nunca tinha lido uma descrição da poesia com que me identificasse tanto! A poesia é, sem dúvida, uma força dos homens que os supera com palavras que parecem de Deus e não nossas!