de Fernando Pinto do Amaral:
Lauren Mendinueta, que organizou,
A memória é o túmulo dos meus versos.
Haverá sempre mausoléus
Para a língua
Enquanto a boca invocar a palavra húmida de sangue,
Cálida de tempo, de breves alegrias e de humores
Onde a voz possa correr, livre,
Sem ser apunhalada pela industriosa mão,
Vazia, maquinal, da morte.
Todos temos corpos que os séculos hão-de consumir.
Mas a fala produz o pensamento,
A mão desenha a letra, o poema enaltece,
No leito sensual feito de frases
Adormece a beleza.
E a inocente, esquiva música das sílabas,
Enlouquecida,
Desperta.
Secretário da alma, o coração
Não descansa na laje da morada em que sossega.
Estremece nos seus sonhos,
E volve em seu redor o olhar desmesurado:
É dia de além sol, além lua, além distância,
Rasgadas as palavras de abandono
E luta. Mas a Terra é a escrita,
E o livro o Universo.
in «Anthero, Areia & Água» de Armando Silva Carvalho (14-03-1938)